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  • Foto do escritorMarcio Oliveira - Vinoticias

“A CHAPADA DIAMANTINA E SEUS VINHOS – PARTE 2”

Continuando a escrever sobre a vitivinicultura baiana, em especial sobre a Chapada Diamantina, vale a pena esclarecer a algumas dúvidas de leitores do Vinotícias sobre os tipos de vitivinicultura no mundo do vinho.

Pode-se dizer que o Brasil é um dos países com maior diversidade e tipos de viticultura, associadas a diferentes condições climáticas (do temperado ao tropical), solos e manejos da videira, resultando em ciclos de produção específicos conforme a região. Atualmente no país estão sendo produzidos comercialmente vinhos em três macro condições distintas, em função das diferentes condições climáticas, decorrentes da geografia e do manejo da videira, apresentando qualidades e tipicidades diferenciadas, cujos tipos de viticultura podem ser caracterizados como:


a) VITICULTURA TRADICIONAL. Neste tipo de viticultura, temos seja no Velho ou no Novo Mundo, apenas uma colheita por ano, sempre no verão, onde são produzidos os “vinhos da viticultura tradicional”. No Brasil, esta viticultura é o padrão há mais de 100 anos em regiões de clima temperado ou subtropical, ambos úmidos, nos Estados do Sul (RS, SC e PR), assim como há décadas em clima subtropical úmido, nos Estados do Sudeste (MG, SP e ES), em altitudes que vão dos 50 aos 1.400 m.


Nesta viticultura, é realizada uma poda da videira e uma colheita de uvas por ano. Esta viticultura normalmente é realizada sem o emprego de irrigação, devido à distribuição de chuvas ao longo de todos os meses do ano. Os biomas predominantes são o Pampa, a Mata Atlântica e o Cerrado. Na Serra Gaúcha, as primeiras Indicações Geográficas (IG) foram desenvolvidas e implementadas, sendo em seguida desenvolvidas outras IGs nas regiões Sul e Nordeste do Brasil


b) VITICULTURA TROPICAL. Em regiões de clima tropical semiárido, cujas altitudes variam entre 50 e 400 m. Nestas condições, geralmente ocorrem duas podas e duas colheitas por ano, cujas uvas são destinadas à elaboração dos chamados “vinhos tropicais” e também de sucos, em qualquer período, através do escalonamento das parcelas do vinhedo.

O exemplo mais marcante desta viticultura é a praticada no Vale do Submédio São Francisco, no polo Petrolina-PE/Juazeiro-BA, onde a videira vem sendo cultivada desde as décadas de 70-80 do séc. XX, e em 2022 obteve sua própria IP (Indicação de Procedência).


Novos projetos estão sendo implantados desde 2020 no Estado de Alagoas, no Baixo São Francisco, nos municípios de Piranhas e Traipu – AL, também em condições de clima tropical semiárido, entre 50 e 300 m de altitude.


O que difere esta viticultura tropical da viticultura tradicional é o regime térmico e o uso da irrigação ao longo do ano, possibilitando à videira produzir de forma contínua. O bioma Caatinga, caracterizada pela presença abundante de cactáceas e espécies arbóreas adaptadas ao clima quente e seco.


c) VITICULTURA DE INVERNO. É mais recente técnica de cultivo de videiras, iniciada nos anos 2000, com a qual são produzidos os chamados “Vinhos de Inverno”. Implantada em regiões de clima subtropical de altitude e tropical e altitude, próximo ou acima dos 1.000 m acima do nível do mar, onde tradicionalmente é realizado o plantio de café.


Teve início no sul de MG e norte de SP, tendo-se expandido para regiões de outros Estados como GO, MS, DF e RJ e até centro da BA, na Chapada Diamantina, em Morro do Chapéu e Mucugê.


Esta viticultura caracteriza-se por ter dois ciclos vitícolas e uma colheita por ano. Para isto, são realizadas duas podas da videira por ano, sendo uma de formação e uma segunda de produção, com apenas uma colheita anual, no inverno (período mais seco). É conhecida como Técnica da Dupla Poda ou Poda Invertida produzindo brancos e tintos tranquilos, bem como espumantes naturais, que têm impulsionado o comércio nos últimos anos.

Nestas condições, as videiras são podadas no mês de agosto, como na viticultura tradicional, sendo realizada uma poda curta de formação de ramos (1ª poda), deixando-se nas plantas apenas esporões com uma gema. Os cachos, normalmente, são eliminados em outubro e novembro. Na sequência, a poda de janeiro e fevereiro é a segunda poda, neste caso, “de produção” (2ª poda) quando também é aplicada a cianamida hidrogenada, para quebrar a dormência das gemas e iniciar uma nova brotação, garantindo a uniformidade da produção.


Desta forma evita-se a colheita em meses tradicionalmente chuvosos, e ela ocorre entre os meses de junho a agosto, em pleno inverno, dependendo das diferentes variedades (entre precoces, intermediárias ou tardias). A partir da combinação entre altitude elevada e época do ano (inverno), pode-se maturar e colher uvas em períodos de estiagem, com baixa ou praticamente nenhuma chuva. Nestas regiões ocorrem dias quentes e noites frias, proporcionando às videiras um desenvolvimento fisiológico particular, criando uvas sadias, com uma maturação mais lenta e manutenção da acidez (menor atividade respiratória das uvas), além de acúmulo de polifenóis e compostos voláteis (aromas e seus precursores). Neste período de colheita, ocorrem temperaturas variando entre 4-8 °C para as mínimas na madrugada, até 22-26 °C durante a tarde, para as máximas.


Neste caso, o bioma predominante é o Cerrado, caracterizado pela presença de uma vegetação adaptada à restrição de água durante os meses de seca, com arbustos e árvores com galhos retorcidos e presença de casca grossa.


As viticulturas “Tropical” e de “Inverno”, constituem novas alternativas de produção, com tipos e estilos de vinhos particulares, com qualidade e identidade. Estas novas viticulturas constituem-se em desafios tecnológicos à tradição, e colocam o Brasil como um país destaque em inovação vitivinícola. Neste aspecto, o Brasil é o único país do mundo onde podem ser observadas estas três viticulturas, e consequentemente, diversificam a geografia da produção nacional e mundial de vinhos.


Uma vez entendido os três tipos de viticultura passamos as visitas das vinícolas da Chapada Diamantina e as notas de degustações dos vinhos. A Chapada Diamantina é uma região montanhosa brasileira no estado da Bahia, conhecida por suas belas paisagens, cachoeiras, grutas, piscinas naturais, café de ótima qualidade, ecoturismo e agora iniciante em enoturismo.

♦ VINICOLA UVVA – localizada na região de Mucugê, tem uma instalação digna de respeito. Com uma arquitetura contemporânea, integrada com a paisagem local, com um vinhedo de 52 hectares cercado pelo deslumbrante panorama da Serra do Sincorá. Uma cadeia de montanhas, que se impõe na paisagem como importante sítio geológico, que possui uma extensão de 80 km e chega a alcançar 2000 metros de altitude, formando vales e cânions. Mucugê, município cortado pelo Rio Paraguaçu que fica a cerca de 450 quilômetros da capital Salvador, se revelou o lugar ideal para a Vinícola UVVA fincar suas raízes. O solo classificado como Franco-Argilo-Arenoso, carrega inúmeras camadas de arenitos, conglomerados e calcários, resultantes de depósitos sedimentares primitivos. Sua profundidade permite uma excelente drenagem, propiciando um perfeito desenvolvimento das raízes, permitindo-as que busquem nutrientes em camadas mais profundas do solo, fator que contribui para a complexidade dos vinhos.


A edificação impressionante foi projetada pela arquiteta Vanja Hertcert, que já desenvolveu vinícolas no Vale dos Vinhedos e Bento Gonçalves, como a Larentis, Luiz Argenta e Guaspari entre outras.


A vinícola é comandada por Fabiano Borré, integrante da terceira geração da família de gaúchos que chegou à Chapada Diamantina em 1984 em busca de novas terras. Em 2012 a família iniciou o projeto da Vinícola UVVA com o plantio de uvas na Chapada Diamantina.


Localizada a 1150 metros acima do mar, amplitude térmica de até 20°C no mesmo dia, períodos de estiagem acompanhados de dias quentes e noites frias, além de solo franco-argilo-arenoso, a região de Mucugê surpreendeu os produtores com terroir único. A vinícola adotou o termo “cepas diamantinas” para classificar o seu processo, que conta com dupla poda e direciona a colheita para o momento ideal.


A vinícola produz vinhos a partir das uvas Chardonnay, Sauvignon Blanc, Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc e Petit Verdot, de larga produção comercial e também microlotes especiais. O objetivo é criar vinhos diferenciados, complexos e de guarda, que ficarão melhores após alguns anos.


Além da edificação moderna, quem chama a atenção é o vinhedo em formato circular aos pés da Serra do Sincorá, inspirado no sistema de pivô. Os vinhos têm assinatura do enólogo Marcelo Pretroli, responsável pela produção.


A vinícola oferece uma variedade de estilos de vinhos, desde tintos encorpados até brancos frescos e leves. Além disso, eles também oferecem vinhos selecionados que foram premiados em concursos nacionais e internacionais.


● Durante a visita na Vinícola UVVA, degustamos os seguintes vinhos:

1)- Sauvignon Blanc 2020 – 12,7% de álcool – um branco límpido e bem claro com aromas cítricos, harmonioso, equilibrado e com personalidade. Um vinho bem vivo ideal para as temperaturas quentes do verão. Temperatura sugerida para serviço de 8 a 10º C, fazendo boa companhia para frutos de mar, peixes e carnes brancas.


2)- Chardonnay Microlote 2021 – 12,5% - vinificado “sur lie”, ou seja, em contato com suas borras, com passagem por barrica de carvalho que dá um toque sutil de especiaria doce de baunilha. Um vinho elegante, complexo, untuoso e com perfil gastronômico. Temperatura sugerida para serviço de 8 a 10º C, fazendo também boa companhia para frutos de mar, peixes e carnes brancas. Aqui valem também as massas com frutos do mar, risotos e queijos de casca com mofo branco.


3)- Cordel 2019 – 13,6% – um blend com 65% de Cabernet Sauvignon, 20% de Merlot e 15% Malbec, criando um belo corte bordalês. Um tinto leve, aromático e agradável, com bom frescor e notas aromáticas de frutas escuras. O vinho é amadurecido por nove meses em barricas de carvalho, o que realça sua complexidade aromática, incluindo notas das frutas escuras, como a ameixa, especiarias e um toque de chocolate amargo. O paladar mostra taninos macios e uma acidez que está em perfeito equilíbrio com o vinho. Temperatura sugerida para serviço de 16 a 18º C. Potencial de guarda de 7 anos. Combina com carnes vermelhas grelhadas, massas com molhos de tomate, cogumelos, queijos maduros e embutidos.


4)- Diamã 2020 – 12,5% – um blend de 36% Cabernet Sauvignon, 26% Cabernet Franc, 23% Malbec, 12% Merlot e 3% de Petit Verdot, novamente um típico corte bordalês. Um tinto elegante, que combina a bela maturação das frutas (como a banana madura, frutas escuras compotadas), chocolate amargo, com elegância trazida pelos 12 meses de estágio em carvalho francês de primeiro uso. Temperatura sugerida para consumo de 16 a 18 º C. Potencial de guarda de 9 anos. Combina com carnes vermelhas grelhadas, cordeiro em molho de hortelã, risoto de cogumelos, queijos maduros e embutidos.


Quem visitar a UVVA terá a oportunidade de conferir a exposição “O Tempo Espelhado”, que reúne obras assinadas por Marcos Zacariades, artista visual baiano radicado na vizinha Igatu.

A proposta da Galeria de Arte na vinícola UVVA é oferecer, literalmente, uma imersão na arte. A mostra está montada no interior da cave da vinícola, espaço nobre localizado abaixo do nível do solo, onde os vinhos estagiam em barricas antes de serem engarrafados. O local foi adaptado e ganhou uma nova atmosfera para abraçar cerca de 20 obras, entre esculturas, instalações, vídeos e assemblagens, algumas com dimensões que passam dos quatro metros. Dividida em vários ambientes, a exposição sugere um fluxo que potencializa as sensações provocadas por cada obra.


A UVVA não é a única vinícola da Chapada Diamantina, mas a primeira na região de Mucugê. Outras vinícolas da Chapada Diamantina são a Reconvexo, uma vinícola onde você se sente como na casa de um amigo, onde se degusta os aromas e sabores da Chapada Diamantina em meio a um “Wine Garden”. Visitamos também a Vinícola Santa Maria e a Vaz – Vinhas do Morro ambas na região de Morro do Chapéu. A Vaz tem diversos rótulos no mercado, entre eles os vinhos Ferro Doido Malbec, Agreste Syrah, Vaz Viogner, Vaz Rose, além de espumantes brut e rosé. Estas vinícolas serão nosso assunto na próxima semana!!!


Saúde!!! Aproveite para comentar se gostou ou não!!! (Este artigo está baseado em material disponível na internet, e minhas considerações durante a prova dos vinhos e pesquisas).


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