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  • Foto do escritorMarcio Oliveira - Vinoticias

“SHAKESPEARE E OS VINHOS EM SUAS OBRAS”

"Se eu tivesse mil filhos, o primeiro princípio humano que lhes ensinaria seria renunciar a toda bebida insípida e dedicar-se inteiramente ao Jerez." (HENRY IV, Parte 2)

Poucos vinhos têm uma citação tão forte como esta que Shakespeare fez sobre o Jerez. E neste artigo que abre a Semana do Jerez, nada melhor que citá-lo a partir da citação do bardo, ou poeta, na Europa antiga, era uma pessoa encarregada de transmitir histórias, mitos, lendas e poemas de forma oral, cantando as histórias do seu povo em poemas recitados. E Shakespeare contou com grandiosidade em suas peças sobre os costumes de sua época.


O vinho estava disponível na Inglaterra de Shakespeare, mas era muito caro (cerca de doze vezes mais caro do que a cerveja) e, portanto, apenas as classes superiores podiam apreciá-lo regularmente. As uvas inglesas não eram adequadas para a produção de vinho, então eles importavam seus vinhos da França, Espanha e Grécia. O Jerez era de longe, o mais popular entre os elisabetanos.

Os vinhos do Jerez, denominação de origem localizada na Andaluzia, sul da Espanha, são singulares. Uma combinação única de história, forma de produção, condições climáticas e, acima de tudo, tradição explicam essa particularidade. Xerez, Jerez e Sherry são três denominações atuais, para a mesma bebida.


A Inglaterra esteve em guerra com a Espanha durante a maior parte do reinado de Elizabeth e duas vezes, na década antes de Shakespeare escrever Henrique IV, a Inglaterra atacou o porto e a cidade de Cádiz, afundou a frota espanhola e fugiu com milhares de barris de vinho de Jerez. Para os elisabetanos, o Jerez era forte, abundante e fazia parte das mercadorias roubadas dos espanhóis, o bastante para explicar sua popularidade com os ingleses.


A outra razão para o sucesso do Jerez foi descoberta pelo biólogo Louis Pasteur. O álcool em uma concentração de cerca de 18 por cento tem um efeito antimicrobiano. Apesar da longa viagem marítima a partir Cádiz, o Jerez continuava potável, enquanto outros vinhos teriam estragado. Esta capacidade do Jerez de sobreviver a uma passagem no oceano entre o Novo e o Velho Mundo, o tornou o vinho de escolha para um cenário cada vez mais próspero em função das grandes navegações.


Como o vinho era um item essencial na alimentação das tripulações e como a região de Jerez era um ramal logístico importante, surgiu uma grande demanda pelos vinhos da região, que passaram a abastecer os navios de diferentes nacionalidades. Foi nesse período que o vinho da região passou a gozar de enorme prestígio na Inglaterra, onde era conhecido como “os vinhos de sherish” e que mais tarde virou Sherry.


Em função de seu método de produção (vinho fortificado, assim como o vinho do Porto), a Inglaterra tornou-se um grande consumidor (Sherry), e com isso no século XIX foram fundadas algumas das vinícolas mais conhecidas nos dias de hoje, como Pedro Domecq (1812), Gonzalez Byass (1835) e Williams & Hubert (1877).


Sobre o Jerez, Shakespeare escreveu em uma passagem de Henrique IV (Parte II) na qual Falstaff elogia os benefícios da bebida para a constituição de uma pessoa: Um bom copo de Jerez tem uma operação dupla. Ele me sobe até o cérebro; seca-me ali todos os vapores tolos, enfadonhos e desagradáveis que o rodeiam; torna-o apreensivo, rápido, esquecido, cheio de formas ágeis, ígneas e deleitáveis, que, entregues à voz, a língua, que é o nascimento, torna-se excelente sagacidade.


A segunda propriedade do excelente Jerez é o aquecimento do sangue; que, antes frio e sedimentado, deixava o fígado branco e pálido, o que é a insígnia da pusilanimidade e da covardia; mas o Jerez o aquece e o faz correr do interior para as partes extremas: ele ilumina o rosto, que como um farol avisa a todo o resto deste pequeno reino, homem, para se armar; e então os plebeus vitais e os espíritos mesquinhos do interior me conduzem até o seu capitão, o coração, que, grande e inchado com este séquito, faz qualquer ato de coragem; e esse valor vem do Jerez. ......


Falstaff argumenta que o Jerez promove uma mente rápida e uma inteligência ágil, um aquecimento do sangue e um aumento de valor. A abstinência leva à covardia, à falta de senso de humor e à incapacidade de gerar filhos. O público de Shakespeare sabia tudo sobre os efeitos de beber Jerez....


Além do Jerez, Shakespeare cita ainda outras bebidas famosas na época, como o vinho das Ilhas Canárias em duas obras: “Noite de Reis” e “As Alegres Comadres de Windsor”.


O VINHO DAS CANÁRIAS - O vinho das Canárias era importado para a Inglaterra a partir das Ilhas Canárias, na costa noroeste da África.


“Noite de Reis” e “As Alegres Comadres de Windsor” são duas das peças em que o dramaturgo e poeta oficial da corte inglesa faz menção a este vinho. Chamando-o de "saco" ou "vinho canário", ele também escreveu versos como este de Henrique IV, "... mas, eu sei, você bebeu canários demais, e esse é um vinho maravilhoso que procura, e perfuma o sangue antes de um posso dizer: o que é isso?”


As origens da Malvasia remontam ao século XV, quando os primeiros colonizadores europeus começaram a plantar uvas nas Ilhas Canárias, substituindo o cultivo da cana-de-açúcar. Entre as muitas variedades importadas estava a casta Malvasia, uma das mais antigas uvas brancas do Mediterrâneo. A casta não demorou a ganhar prestígio pelo rendimento da fruta, criando um vinho doce com notas de amêndoa e tons ácidos. Com uma cor entre torrada e âmbar, também libera aromas finos, equilibrados e intensos.


Graças à posição estratégica da ilha nas rotas de navegação pela Europa, América e África, os vinhos de Malvasia das Ilhas Canárias logo se tornaram um produto de exportação frequente e adquiriram fama nas cortes europeias, particularmente na Inglaterra. Por volta de 1640, mercadores de vinho ingleses chegavam a classificar a bebida das ilhas como “o vinho luxuoso de Tenerife” (uma de suas capitais, juntamente com Las Palmas). Ele era mais doce do que o Jerez e feito com Malmsey (Malvasia), no entanto, um vinho conhecido como Vidonia (outro nome para a variedade Verdelho) era relativamente seco, tinha acidez elevada e envelhecia bem.


Portanto, talvez não seja surpreendente que não apenas Shakespeare, mas também Walter Scott e Lord Byron mencionem o vinho das Ilhas Canárias em seus trabalhos.


Mas depois de uma era de grande esplendor, veio a decadência. Os confrontos entre as coroas de Espanha e Inglaterra e as duas pragas que brutalizaram as vinhas das Canárias - uma em 1852 e outra em 1878 - acabaram com a produção do vinho Malvasia. Foi só na década de 1990 que alguns produtores de vinho nas Ilhas Canárias decidiram tentar recuperar esta velha estrela das ilhas. Graças à sua visão e dedicação, Malvasia recuperou o prestígio de outrora.


Embora existam variedades doces e espumantes, três Malvasias das ilhas Canárias são considerados dos melhores vinhos doces do mundo: Malvasia Carballo, da ilha de La Palma; Malvasia Teneguía, também de La Palma; e Malvasia Bermejo, também chamado de vinho vulcânico, feito na ilha de Lanzarote. Experimente este delicioso tesouro e que isto seja apenas o início de uma longa exploração das excepcionais bebidas citadas pelo bardo.


O VINHO DA MADEIRA - Vinho rico e doce trazido da Ilha da Madeira para a Inglaterra no século XVI, o Malmsey foi citado em duas obras: Trabalhos de Amor Perdidos (5.2.240) e Henrique IV – Parte II (2.1.36), mas a referência mais famosa à Malmsey em toda a literatura pode ser encontrada em Ricardo III, quando Ricardo ordena a execução de seu irmão, o duque de Clarence. Os assassinos contratados de Richard decidem afogar Clarence em um grande barril da bebida. Quando eles chegam à Torre de Londres para realizar a tarefa, o desavisado Clarence pede uma taça de vinho. O Segundo Assassino oferece esta réplica medonha: "Terá bastante vinho, meu senhor, logo" (1.4.153).


Na Ilha da Madeira, não muito distante das Canárias, as pipas de Malmsey geralmente ficavam ao ar livre e o vinho oxidava, tomando uma cor marrom, mas a temperatura elevada acabava por lhe dar um bom sabor. Acredita-se, porém, que os primeiros vinhos ditos Malmsey que chegaram à Inglaterra, na verdade, tenham vindo da Grécia ainda na época medieval.


O HIDROMEL - Conhecido também como vinho de mel, o Hidromel era mais um tônico do que um coquetel agradável. Era feito de água, fermento, mel, cravo e ervas potentes. Referências ao Hidromel aparecem em Trabalhos de Amor Perdidos (5.2.240) e As Alegres Comadres de Windsor (5.5.170).


O VINHO DE BUCELAS - É na peça Henrique VI que William Shakespeare fala do vinho de Bucelas, chamando-o de "charneco", como era conhecido há cinco séculos. Se gostou ou não o vinho não é claro, mas gostou o suficiente para lhe ficar na memória e fazer dele bebida de eleição num drama histórico. É a prova que já este vinho andava nas bocas dos ingleses há pelo menos 425 anos.


Apelidado de príncipe dos vinhos Portugueses, em Bucelas produz-se o mais afamado branco seco do país, recorrendo à casta Arinto que foi cultivada e desenvolvida pelos Romanos há mais de 2000 anos. Os marinheiros da caravela São Gabriel celebraram com vinho de Bucelas o seu regresso a Portugal, depois da descoberta do caminho marítimo para a Índia.


Durante as invasões francesas, no período das Guerras Napoleônicas, o vinho de Bucelas seduziu o Duque de Wellington, além de habitual consumidor, também enviada o delicioso néctar para Jorge III, Rei da Inglaterra.


Bucelas tem três grandes vantagens: proximidade a Lisboa, extraordinárias condições de micro-clima para produção principalmente de vinhos brancos de excelência e a casta Arinto, que encontrou ali as condições perfeitas para se poder expressar em toda a sua plenitude. E você pode beber o Quinta da Murta com seu rótulo dedicado ao bardo.


CERVEJA E ALE - Ale (cerveja feita com uma levedura de alta fermentação) era uma bebida muito comum na época de Shakespeare. Todos, desde o fazendeiro mais pobre até a própria Rainha, bebiam a cerveja feita com malte, e uma mini cervejaria era uma parte essencial de cada casa. O próprio pai de Shakespeare era um degustador oficial de cerveja em Stratford - um trabalho importante e respeitado que envolvia monitorar os ingredientes usados por cervejeiros profissionais e garantir que eles vendessem sua cerveja a preços regulados pela Coroa.


A cerveja, no entanto, acabou se tornando mais popular do que a Ale. Em 1574, ainda havia 58 fabricantes de cerveja para 33 fabricantes de Ale em Londres, mas a cerveja gradualmente substituiu a Ale como a bebida nacional ao longo do século !!!


Saúde!!! Aproveite para comentar se gostou ou não!!! (baseado em artigos disponíveis na internet e minhas considerações)

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