Via de regra as paisagens de vinhedos são exuberantes. Mas o que pensar de vinhedos em paisagens desérticas?
Por exemplo, o que falar dos vinhedos cultivados no Deserto chileno do Atacama, considerado o mais seco do mundo. É tão seco que muitas vezes é comparado às paisagens de Marte.
Os enólogos, como regra geral, não resistem à oportunidade de produzir vinho em terras interessantes e nunca antes exploradas. É por isso que o Atacama oferece um lugar ideal para a realização de experimentos que, hoje, graças a um pouco de água e muitas práticas inovadoras, estão produzindo resultados positivos.
A produção de vinho na região desértica setentrional do Chile começou com a chegada dos espanhóis, que queriam uma produção local para as missas católicas, principalmente nas localidades de Pica e Matilla. Este vinho tornou-se conhecido local, nacional e até internacionalmente, com um estilo tipo do Vinho do Porto. Essa produção desapareceu ao longo do século 20 devido a múltiplos fatores como a desapropriação da água, o fechamento das oficinas de salitre, leis de proteção e outros. No entanto, a história do vinho do deserto foi relevante para a região.
O “Desert Wine Project” é um esforço desenvolvido por uma equipe da Universidade Arturo Prat há 15 anos, que visa resgatar uma tradição perdida da Região de Tarapacá. Um processo de pesquisa aplicada que envolveu a compilação de informações históricas, busca de material vegetal, adaptação de novas técnicas de cultivo e experimentos contínuos em irrigação, fertirrigação, manejo e outros tem conseguido comunicar os resultados aos cultivadores, ajudando-os a evoluir de uma produção artesanal ("pisa da uva" e gestão enológica rudimentar) para uma produção de tipo industrial com especialistas e linhas de produção, com o apoio do Governo Regional de Tarapacá.
Codpa é digno de nota na zona desértica; a sua produção de vinho, principalmente da casta País, conseguiu sobreviver e continuar a produzir o seu vinho Pintatani. Uma adição mais recente é o vinho Ayllú, produzido perto de San Pedro de Atacama a uma altitude de 2.400 m. Estes exemplos mostram a oportunidade do deserto de oferecer algo novo, diferente e característico de cada região, dando uma contribuição para a agricultura nacional. A produção de vinho no deserto aumenta a diversidade de vinhos originais e regionais com características únicas.
O “TERROIR” DO ATACAMA - Os fanáticos por vinho procuram constantemente o “terroir” mais excepcional (características edafoclimáticas que podem ser saboreadas nas uvas e no vinho que produzem). O “terroir” do Atacama é particularmente terroso e rústico, uma experiência única para o paladar insaciável dos amantes do vinho.
Alguns enólogos acreditam que o deserto tem qualidades que dão aos vinhos impressões digitais exclusivas. No mundo do vinho, existe a ideia difusa de terroir, a noção de que o sabor do lugar transparece, que o sol e o viticultor e os métodos e a colheita e o solo e a umidade e o vento e a chuva dão forma ao sabor. Por exemplo, Chablis tem um sabor mineral de giz por causa do solo em que crescem as uvas Chardonnay. Da mesma forma, os desertos ao longo do mundo têm suas próprias assinaturas territoriais.
A maioria dos vinhedos do Atacama estão localizados próximos à costa do Pacífico, onde podem aproveitar os recursos nutritivos da região e do mar. No entanto, existem outros vinhedos que foram cultivados nos setores mais inóspitos, incluindo Toconao e San Pedro de Atacama. A produção de vinho nestas áreas é principalmente artesanal.
A agricultura no deserto é feita por pequenos agricultores em áreas reduzidas. Isso permitirá ter um produto que pode ser considerado do tipo "boutique", de alto valor econômico em pequenos pomares, com mão de obra intensiva e manejo personalizado, vendido no pomar pelo agricultor que o produz, associado a outras indústrias como turismo e gastronomia com um mínimo de intermediários. A integração com outras áreas econômicas é especialmente apta para a produção de vinho, podendo ser explorada e inclusive utilizada para introdução de outras culturas e atividades das fazendas e zonas de cultivo.
O projeto permitiu também redescobrir velhas variedades perdidas (uva País, Gros Colman, Torrontés, Ahmeur), redescobriu a produção de vinho em outras áreas da Região como a Pampa del Tamarugal.
VALE DO COPIAPÓ – Verdadeiros oásis de cor esmeralda, estes vinhedos destacam-se como joias no contraste do relevo torrado que circunda a cidade de Copiapó. A produção de uvas, em grande parte é exportada para os Estados Unidos, o que sustenta a economia da cidade, que se baseia principalmente na mineração.
Indo na direção sudeste cega-se à vila agrícola de San Fernando, onde muito bons vinhos locais são produzidos desde 1940, um lugar onde a cultura do vinho faz parte da comunidade.
VALE DE HUASCO - O Vale do Huasco é freqüentemente referido como o “Jardim do Atacama”. Embora a uva País (para produção do pisco) seja o produto mais produzido na região, alguns vinhos verdadeiramente fantásticos estão ganhando reconhecimento.
Os vinhedos de Huasco são constantemente banhados pelo sol, devido aos picos baixos das montanhas costeiras. Somados a isso, estão os ventos quentes que transportam a essência sutil e salgada do Oceano Pacífico. O Parque Nacional Llanos de Challe, repleto de flores e vida selvagem, é um paraíso verdadeiramente fértil para a produção de vinho.
TOCONAO E SAN PEDRO DE ATACAMA - A mil quilômetros ao norte de Huasco, do outro lado do Deserto de Atacama, uma organização chamada Atacama Tierra Fértil tem trabalhado com vinicultores locais e profissionais para desenvolver os vinhedos Toconao nas áreas circundantes de San Pedro.
As safras do vinho Ayllu produzidas na região obtiveram resultados muito promissores. Em Talabre, a 30 km a sudeste de Toconao, a uma altitude impressionante de 3.500 m, foram plantados vários vinhedos, considerados os mais altos do mundo.
E vale lembrar que outras regiões desérticas estão produzindo vinhos ao longo do mundo, como o Deserto de Gobi na China, regiões desérticas do Arizona e Texas nos Estados Unidos, Deserto de Negev em Israel, o que demonstra que não há limites para a criatividade em vinhos.
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